Façam-se  as contas com transparência. O transporte individual deve ajudar a financiar o  transporte colectivo!
 Há  vários anos que o GEOTA vem defendendo que a principal solução para os problemas  de mobilidade nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto é a forte aposta nos  transportes colectivos.
 Este  ano, por ocasião da Semana Europeia da Mobilidade, queremos focar-nos no  financiamento do transporte colectivo nas áreas metropolitanas. A medida  recentemente tomada pelo Governo de aumentar o preço dos títulos de transporte é  uma medida avulsa e sem o necessário enquadramento. Assim, o GEOTA defende o  seguinte:
 ·          É  preciso analisar a questão dos transportes à escala correcta – a escala  metropolitana. Não é possível continuar a pensar no problema à escala  municipal (por ex. na questão da gestão dos estacionamentos) ou à escala  empresarial (Carris, CP, Transtejo, etc.). Este papel tem de ser desempenhado  pela autoridade metropolitana de transportes que deve ser dotada de poderes e  meios para que possa ter realmente autoridade.
 ·          As  empresas (sejam públicas ou privadas) devem ser geridas de modo eficiente. Devem  ter assegurada uma rentabilidade adequada, justa para o serviço que desempenham.  É possível efectuar estudos comparativos entre empresas, incluindo empresas  noutros países que conduzam ao estabelecimento de metas de eficiência para as  empresas. Se se pretende que o transporte colectivo ganhe quota, podem ser  estabelecidos incentivos às empresas que ganhem passageiros.
 ·           Muito provavelmente existirão linhas ou zonas  economicamente rentáveis e outras em que a operação é deficitária. É necessário  efectuar a contabilidade completa, de modo transparente. Pode ser necessário  realizar transferências de fundos entre operadores.
 ·           Se se concluir que no conjunto da área  metropolitana os proveitos não pagam os custos, então alguém tem de pagar o  défice. O GEOTA defende que o transporte individual deve contribuir para suprir  este défice, internalizando-se assim os diversos impactes ambientais associados  ao transporte individual.
 A evolução dos  transportes colectivos
 Aspectos  positivos
 ·          O  novo título sub23 funciona em 120 operadores e com 50% descontos para os  estudantes universitários; O passe Social + permite também descontos  significativos para pessoas com maiores dificuldades financeiras. Ambos são  instrumentos positivos no acesso socialmente mais justo aos transportes  colectivos. Os descontos nos passes sociais devido a dificuldades financeiras  são, contudo, de obtenção complicada e morosa face aos títulos  normais;
 ·           O aumento progressivo das zonas de  estacionamento tarifado e acesso exclusivo a moradores e transportes colectivos  na cidade de Lisboa. Retirar espaço a passeios para fazer estacionamentos,  contudo, está errado se não for enquadrado num plano geral de acessibilidade e  mobilidade para a zona e se o espaço que sobrar for menor que o mínimo  admissível (1,20 m). Mais errado, ainda, se o novo estacionamento não for  tarifado de modo a amortizar os custos do investimento.
 ·          O  grande investimento que tem sido feito em vias cicláveis nas principais cidades  do país e mesmo nas suas periferias é digno de mérito, pois representa um  reconhecimento público da importância deste meio de transporte. Contudo, não se  deve confundir a árvore com a floresta. É importante disponibilizar aos cidadãos  condições físicas e materiais para um uso massivo desse meio de transporte em  todas as vias urbanas, transportes colectivos, bem como locais seguros para o  parqueamento de bicicletas. A disponibilização de bicicletas públicas em  quantidade é mais importante que ter vias cicláveis conflituantes quer com o  trânsito rodoviário quer com o trânsito e atravessamento de peões.
 Aspectos  negativos:
 ·           A bilhética ainda não está em pleno  funcionamento na AML. Há mais de 500 títulos diferentes, conforme os operadores  e os percursos e isso em nada ajuda os utilizadores, colocando os serviços de  transporte em competição erosiva do mercado de utilizadores, promovendo o desvio  para o transporte individual;
 ·           Investiu-se no modo rodoviário de médio e  longo curso o que se deveria ter investido em infra-estruturas destinadas ao  transporte público. Para deslocações dentro da AML é mais eficaz o uso do  transporte individual sobre o transporte público para ligar localidades fora dos  eixos principais de penduralidade ou dos horários de ponta, e isso é um forte  indicador de mau ordenamento do território e da mobilidade;
 ·           A informação aos utilizadores sobre as  alterações de carreiras nem sempre são feitas com a necessária exposição,  prejudicando o seu uso e o nível de satisfação dos utentes;
 ·           A segurança de horário nalguns operadores e  carreiras tem melhorado nos períodos normais diários mas nos períodos fora das  horas de ponta espera-se e desespera-se por ligações, especialmente para as  zonas suburbanas;
 ·           A segurança física dos passageiros tem-se  reduzido, é preciso reforçar a presença e a visibilidade das forças policiais e  dos serviços de vigilância nas estações, apeadeiros, paragens e no interior dos  transportes colectivos; 
 ·           A evolução na acessibilidade nos transportes  colectivos e respectivas paragens tem sido extremamente limitada;
 ·           A fiscalização do estacionamento abusivo em  locais de paragem de transportes colectivos e passagem exclusiva de transportes  colectivos, de peões ou bicicletas é incipiente e ineficaz na generalidade do  território;
 ·            O ordenamento do território continua a ser  feito assumindo um preço de combustíveis de há dezenas de anos atrás:  continuam-se a abrir grandes centralidades que apenas são acessíveis de  transporte individual, continua a dispersão urbana que motiva o movimento diário  pendular e uma ocupação excessiva de território em infra-estruturas ligadas ao  modo rodoviário, tudo factores que contribuem para um desenvolvimento  territorial energívoro e anti-ecológico.
 PROPOSTAS
 A  crise financeira actual facilita o desenvolvimento das tendências negativas mas  também pode dar força a oportunidades de melhoria e até de mudança de paradigma  em relação à mobilidade nas áreas metropolitanas.
 ·          Um  conjunto de ideias para colocar o individual a financiar o colectivo pode já ser  avançado (por via de uma fracção da tarifa ou de uma taxa sobre emissões ou uso  do espaço público: portagens existentes, parquímetros, parques no interior da  cidade.
 ·          Visando  internalizar custos associados ao transporte individual na gestão da coisa  pública, na generalidade das auto-estradas radiais às áreas metropolitanas  deverá: (i) ser reforçada ou instituída a portagem para a entrada de veículos  nas cidades; (ii) nas vias e auto-estradas que têm 3 faixas de circulação em  cada lado, ser reservada uma faixa para a circulação de transportes colectivos,  prioritários e veículos de TI acima de 5 lugares com ocupação de 75%;
 ·          Na  generalidade das vias de cintura deverá ser desonerada a portagem, quando  existe, devido ao efeito de distribuição de tráfego e descongestionamento nos  centros urbanos;
 ·          Planear  os transportes colectivos visando o ponto de vista do utilizador: passe ou  bilhete único (qualquer que seja o operador), bilhética, intermodalidade,  economia, segurança de horário e segurança física dos passageiros, facilitação  de modos suaves de transporte;
 ·          Baixar  os impostos para os equipamentos destinados a modos suaves de transporte, como  as bicicletas. Não são um luxo, e para muitos cidadãos, são uma  necessidade;
 ·          O  novo aeroporto de Lisboa é uma miragem cara e inútil. Temos um aeroporto da  Portela que serve as necessidades de toda esta região e é uma boa aposta para os  voos low-cost e para o turismo em Lisboa e arredores. Está muito longe da  saturação e tem excelente operabilidade aeronáutica (é mesmo um dos melhores da  Europa). Os aspectos da segurança e do ruído podem ser significativamente  melhorados com investimentos relativamente modestos;
 ·          Devem  ser retomadas as obras de extensão do metropolitano de Lisboa ao aeroporto da  Portela (suspensas a pretexto da crise). Ésta linha é essencial para melhorar a  acessibilidade ao aeroporto e a sua interligação com a restante rede de  transportes;
 ·          As  redes de metro ligeiro devem ser densificadas em Lisboa, na margem Sul do Tejo e  no Porto. É um transporte amigável, com grande capacidade de captação de  passageiros que antes utilizavam o automóvel individual;
 ·          No  projecto da ferrovia Poceirão-Caia, não se deve “deitar fora o bébé com a água  do banho” — o projecto herdado do Governo anterior tem aspectos bons e maus,  devendo ser renegociado mas não abandonado. Deve avançar-se a linha em bitola  europeia Poceirão-Caia, mas mista (passageiros e carga), com electrificação e  sinalização standard europeia; é uma ligação estratégica para o País e com  elevada participação comunitária. Devem ser adicionadas ligações em bitola  europeia (i) até ao terminal de passageiros do Pinhal Novo, permitindo a ligação  Lisboa-Madrid por comboios de bitola variável e (ii) até ao porto de Sines para  permitir a sua ligação à rede europeia. Por outro lado, deve evidentemente ser  cancelada a linha de bitola ibérica Poceirão-Caia, que não faz qualquer espécie  de sentido;
 ·          A  rede ferroviária convencional deve ser repensada, na lógica do primado ao  transporte público eficiente e do serviço público, em especial em regiões mal  servidas de acessibilidades. Entre outros casos, refira-se o imperativo de  salvar a linha do Tua (condenada a desaparecer pela má gestão e pela inútil  barragem de Foz Tua);
 ·          Todos  os projectos de auto-estradas cuja construção ainda não se iniciou devem ser  cancelados, pendendo uma revisão profunda. Todos os projectos de auto-estradas  em obra (novas ou ampliações) devem ser suspensos, urgentemente reavaliados, e  ser concluídos apenas se uma análise rigorosa custo-benefício demonstrar a sua  absoluta necessidade. Apenas devem prosseguir regularmente obras de manutenção e  reparação.